Poema: Ao meu nobre pai Pedro Fazendeiro e outros tantos Companheiros

O que dizer de você que quase não conheci!
Que tão pouco vi e quase não convivi,
É só falar da saudade! Saudade do que não tive,
Do homem bom com
panheiro, do Pedro pai e amigo,
Do refúgio no abrigo do abraço protetor,
Que a ditadura roubou.

São cinco os filhos de Pedro, sendo eu a derradeira,
Quase nada me sobrou, pois as alegrias de filha,
A ditadura tão desumana tão crua,
Brutalmente me fraudou,
Roubou-me a paternidade e em órfã me tornou.

O meu coração, ainda sofre e chora essa dor,
A dor da saudade do direito suprimido,
De ao seu lado ter crescido, seus abraços e carinho recebido,
Vê-lo sorrir de alegria, enquanto eu acertava,
E, receber correção quando na vida eu errava,
Tudo me foi tirado, não posso mais me calar,
Explode coração! Chora coração!
Fala da tua dor com emoção e razão.

Isso, sem falar da dor dos que já sabiam o que é a dor,
Pois, a mim coube a dor da inocência,
Da espera prolongada, da sua utópica chegada,
Que, na minha ingenuidade era por mim aguardada,
Na minha fé infantil que assim acreditava,
Que, tal como o Cristo um dia ressuscitou,
E em refulgente gloria para o pai retornou,
Eu cria e confiante orava, pela volta do meu pai,
Mas ele jamais chegou.

O que dizer da dor, de quem já sabia o que é dor!
De quem antes já sofria!
O que dizer então da dor de Maria?
Minha mãe que de tanto que chorou,
Como uma rosa murchou, ressecou, expirou,
Por conhecer o sentir do coração,
Sabia que seu amado, jamais ao lar tornaria,
Que ela agora seria só,
Só solidão, tristeza, e agonia.

Como criar seus cinco filhos Maria?
Na angustia de saber que Pedro,
Pai, provedor, fora tiranizado pela lei da ditadura,
A lei que ditou tão dura a vida, martírio e morte,
Do Pedro que honra e paz proclamava,
Sim! Por esta causa lutava, vida, paz e honradez,
Aos amigos, companheiros camponeses,
Torturados, humilhados, indefesos,
Por algozes e covardes capatazes.

E, o que dizer da dor das minhas irmãs e irmãos?
Nadieje, Josineide, Marinarde e o Walter,
Por já entenderem tudo ou quem sabe quase tudo,
Em pouco tempo sabiam, que pai nunca mais teriam.

Ai, Quão grande foi essa dor,
Que tem por nome orfandade!
Que aflige os corações sem escolha de idade.

Como doeu essa dor crucial e cabalista,
Ao saberem, que Pedro não mais veriam,
O pai amoroso, corajoso e idealista,
Sim! Meu pai era um sonhador,
E, pra esses quatro filhos profissão assim sonhou,
Essa será doutora e a outra professora,
Esse menino engenheiro e aquele advogado,
(só para mim tão pequena a ditadura tão dura
Roubou-lhe o tempo do sonho e o vazio ficou).

Ai! Quão grande foi essa dor,
Que tem por nome orfandade!
Que magoa corações, independente da idade.

Respondam-me, por favor,
O que fazer de um amor
Que não tem o ser amado,
Que fora dos meus pequenos braços tirado,
Deixando-me apenas dor e saudades,
Fome, medo, pranto e fragilidade.

Cadê o meu pai amado?
Respondam-me, por favor, tiranas autoridades,
Ditadores cruéis de vidas ensangüentadas,
Respondam-me, por favor, o que faço com essa dor?

E o que dizer da dor de outros tantos companheiros?
Guardada nos corações de quem tanto amor perdeu.
Tantos Pedros, Joãos, Josés, Assis e os Agassiz
As Marias, Margaridas, as Rosas, as Betes e Elizabetes
Os Lemos e também os que não lemos,
Que tiveram seus amores como ramos arrancados,
Iguais pétalas de flores extraídas, esmagadas
Pelas mãos ensangüentadas dessa dita cuja dura,
Freando-lhes o pulsar dos vibrantes corações!

O que dizer para quem tanto chorou,
Gritou, sofreu e venceu,
Sim! Venceu, Pedro e outros tantos companheiros,
Pois o sangue irrompido no mundo e nesse Brasil querido,
Hoje renasce e aflora com ardor e esperança,
Por sabermos que a cada ramo arrancado,
A cada pétala extraída e a cada flor esmagada,
O sonho é mais sonhado, desejado e por fim realizado,
Pois, pulsam fortes os corações dos Pedros, e dos Joãos,
Das Marias, Margaridas, Rosas e Elizabetes
Dos Lemos e também dos que não lemos,
Que a tanto sobreviveram.

Enfim, ao meu saudoso e honrado pai,
Pedro Inácio de Araújo,
Nosso nobre Pedro Fazendeiro,
Nosso sim, pois nunca foste só meu,
Pois como exemplo de honra, heroísmo e altruísmo,
Destes a tua vida por esse Brasil querido.

E, que esse bravo povo brasileiro,
Honre ao meu nobre pai Pedro Fazendeiro,
E, outros tantos companheiros
Que de tanto padeceram.

Em nome da minha mãe (in memória) minhas irmãs e irmãos,
Deixo a você meu pai, meu amor, minha saudade,
Minha dor que tanto doeu e dói,
Mas em especial deixo a você minha grande admiração,
Pois, me orgulho de olhar para o amanhã e ver,
Que aquela luta, a sua luta!
Que parecia tão amarga e inglória,
Hoje é escrita na história como a luta de um grande vencedor!

Obrigada, Pedro Fazendeiro e outros tantos companheiros.

Com amor,
Náugia Maria de Araújo (Náugia Fazendeiro)
 é filha do camponês Pedro Inácio de Araújo, conhecido como Pedro Fazendeiro.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *