Reportagem: “Das Ligas Camponesas ao MST” – Uma visão crítica

Por João Fragoso

Em outubro de 2012 o Sistema Correio de Comunicação publicou uma série de reportagens sob o título acima, as quais estão postadas no site do Memorial das Ligas.

Nas entrevistas houve manifestações desfavoráveis ao MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – talvez por falta de um maior conhecimento, por isso, achamos oportuno registrar algumas informações sobre esse Movimento que luta bravamente pelo homem do campo.

O MST foi fundado há 33 anos por trabalhadores expulsos de suas terras, sendo seu objetivo formar um movimento camponês autônomo, sem alinhamento político partidário e que lute pela Reforma Agrária e transformações sociais. Seus integrantes eram: atingidos por barragens, meeiros, posseiros, pequenos agricultores, todos impedidos de produzir sua própria alimentação. Tratava-se de vítimas seculares do latifúndio.

Vamos ilustrar um exemplo de banimento do campo: Em 1964, com o golpe empresarial-militar, muitos trabalhadores rurais foram expulsos das terras onde moravam. Uma das propriedades mais famosas – a Fazenda Miriri – (Mamanguape), onde foi assassinado o líder camponês Alfredo Nascimento, expulsou centenas de moradores, os quais formaram um aglomerado na entrada da cidade de Cajá a que foi dado o nome de Nova Cuba.

Com a ditadura militar as multinacionais foram assumindo mais e mais o controle do campo, formando a agroindústria (hoje agronegócio), que aumentou ainda mais o sofrimento do camponês, criando o trabalho temporário – boias frias – e utilizando pouca mão de obra com a agropecuária e mecanização da lavoura.

O MST participou dos movimentos políticos como “Diretas já” e empenhou-se profundamente na construção da constituição de 1988, conquistando a aprovação de artigos que possibilitam a desapropriação de terras que não cumpram sua função social. Como herdeiro das Ligas Camponesas conheceu bem de perto a “ira, raiva e violência do latifúndio – um latifúndio que não se envergonhou de aparecer publicamente e oficialmente, como a União Democrática Ruralista (UDR), defendendo a violência armada contra a Reforma Agrária e a todas e todos aqueles que lutavam por ela – com mais de 1000 camponeses e defensores da Reforma Agrária assassinados nos últimos 14 anos”.

O MST não trabalha somente pela Reforma Agrária, embora esta seja uma de suas principais metas. Com o compromisso de produzir alimentos para o povo brasileiro, já organizou mais de 100 cooperativas, de 1.900 associações nos assentamentos. Trabalhando de forma coletiva para produzir alimentos contribuiu na construção de mais de 96 agroindústrias, que além de melhorar a renda e as condições do trabalho no campo, também oferecem alimentos de qualidade.

Bandeiras de luta do MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS SEM TERRA:

CULTURA: “A educação e o acesso à cultura, ao conhecimento, a valorização dos saberes populares, é condição fundamental para a realização dos brasileiros como seres humanos plenos, com dignidade e altivez. Queremos a democratização e a popularização da cultura no país. Fortalecer os espaços de trocas culturais promovendo o acesso popular aos teatros, cinemas, exposições, sinfonias, amostras, apresentações folclóricas e festas tradicionais. Esta palavra de ordem está materializada no outro Brasil que queremos construir no cotidiano. Um outro país que construímos com 2 mil escolas públicas em acampamentos e assentamentos, que garantem o acesso à educação à mais de 160 mil crianças e adolescentes Sem Terras, ou que alfabetizaram 50 mil adultos e jovens nos últimos anos. Ou ainda, nos mais de 100 cursos de graduação em parceria com universidades por todo o Brasil”.

DEMOCRATIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO: “O povo tem o direito de organizar seus próprios meios de comunicação social, de forma associativa. E o Estado deve garantir os recursos para que exerça esse direito. É preciso democratizar os meios de comunicação, começando por acabar com o monopólio privado dos meios. Atualmente no Brasil menos de dez grupos – constituídos por famílias ou agremiações religiosas – controlam as maiores redes de comunicação, incluindo televisão, rádio, jornais, revistas e portais na internet.”

SAÚDE PÚBLICA: “O Estado deve garantir e defender a saúde de toda a população, implementando políticas públicas de soberania, segurança alimentar, de condições de vida dignas, como medidas preventivas às doenças. O sistema de saúde pública (SUS) deve ser ampliado e melhorado, combinando com o Programa de Saúde da Família (PSF) preventivo, incluindo o atendimento médico-odontológico e de enfermagem”.

DESENVOLVIMENTO: “As políticas de desenvolvimento da economia devem estar baseadas fundamentalmente nos interesses de melhoria das condições de vida de toda a população, em especial dos mais pobres. Sua missão é produzir bens que eliminem o grau de pobreza e a desigualdade social existentes em nosso país. A organização da produção deve buscar em primeiro lugar o atendimento das necessidades básicas de toda a população brasileira. Por isso, lutamos por uma economia que estimule a produção de bens e possibilite a eliminação da pobreza e da desigualdade social. Que privilegie o trabalho e a qualidade de vida do povo brasileiro, com crescimento e distribuição de renda valorizando uma economia mais justa e solidária”.

SISTEMA POLÍTICO: “Queremos um país que crie e utilize permanentemente mecanismos de participação e decisão direta da população, nas várias instâncias de decisão do poder político e social, construindo uma verdadeira democracia popular participativa. É preciso regulamentar os plebiscitos, referendos e consultas populares para tomada de decisões de importância para o povo. Defendemos uma ampla reforma política que garanta liberdade de organização política e partidária, financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais em todos os níveis, controle da propaganda mentirosa, fidelidade partidária, revogação de mandatos pelo voto popular, fim do sigilo bancário, patrimonial e fiscal de todos os candidatos e de todos ocupantes de cargos públicos, em todos os níveis. Ajuste dos salários de todos eleitos equivalente à média dos ganhos dos servidores públicos”.

SOBERANIA NACIONAL E POPULAR: “Precisamos de políticas e práticas dos governantes que garantam a pleno soberania de nosso povo, sobre nosso território, nossas riquezas naturais, minerais, nossa biodiversidade, a água e as sementes. O Estado deve ter o controle com a participação da sociedade e dos trabalhadores, e das empresas estratégicas para o desenvolvimento nacional que já existem e criar as que forem necessárias para gerirem as riquezas”.

Como se vê, não cabe a expressão de um dos entrevistados: “O MST não fez nada a não ser enricar Zé Rainha”. Não é verdade, o MST, como a CPT, sua irmã mais velha, luta pelo homem e mulher do campo, buscando a conquista de uma vida digna, extensiva para todos os brasileiros. O MST não é um Movimento de Guerrilheiros como afirma o presidente da FAEPA, os Trabalhadores lutam por um pedaço de terra, que lhes cabe por justiça.

 

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